BLOG LELSON SANTOS
03/03/2017 07h50
- Atualizado em
03/03/2017 08h36
'Asa Branca' chega a 70 anos atual e imortalizada na voz de Luiz Gonzaga
Música ficou em 4º lugar entre as 100 mais importantes da história do Brasil.
Duas versões da música foram gravadas na parceria com Humberto Teixeira.
No dia 3 de março de 1947
Luiz Gonzaga
gravava pela primeira vez nos estúdios da RCA, no Rio de Janeiro, a
canção que ficaria imortalizada como hino dos nordestinos. Uma
composição dele com o médico Humberto Teixeira, que passou dois anos
para ser concretizada. A gravação foi acompanhada pelo grupo de Regional
do Canhoto.
Ao fim do trabalho, Canhoto, líder do grupo, olha para Gonzaga e diz
que a "letra era música para cego pedir esmolas". Sai dos estúdios e
zomba com um chapéu pedindo esmolas ao som da canção. Mal sabia Canhoto
que Asa Branca iria ser um nos maiores sucessos da música brasileira.
Foram duas versões da música que virou referência e marca de um povo. A
primeira foi gravada pelo próprio Gonzaga em forma de toada e logo fez
sucesso, levando o artista pela primeira vez ao cinema, tocando a música
no filme 'O Mundo é um Pandeiro'.
Nesta época, Gonzaga já havia iniciado a transposição dos gêneros
musicais nordestinos para a mescla com o choro carioca. Asa Branca foi
essencial para preparar o terreno para o Baião, que seria gravado ano
seguinte e viraria uma febre nacional.
O sanfoneiro logo percebe que uma repaginação poderia ser a saída para
reiventar a toada. Talvez Luiz Gonzaga não imaginasse o tamanho da
proporção que Asa Branca ganharia ao gravar um Baião com a mesma letra.
Essa nova versão foi lançada três anos mais tarde, em 1950, num compacto
que trazia 'Paraíba' do outro lado, o que aumentou ainda mais o
sucesso, já que as duas canções ecoaram nas rádios e vitrolas do Brasil.
O professor e historiador Armando Andrade diz que a identidade do
cantor se confunde com a letra de Asa Branca. Para ele a canção é marca
registrada de Gonzaga. É nela que se misturam o homem, a música e seu
povo. "A partir de Asa Branca o Brasil viu o drama através da voz do
próprio nordestino. É dessas coisas que a poesia e a literatura
conseguem fazer, transportar através da linguagem as pessoas a vivenciar
a dor do outro" diz.
Armando Andrade pesquisa obra de Gonzaga
(Foto: Arquivo pessoal/Armando Andrade)
Outra característica marcante de Asa Branca é a saudade do amor perdido
com o exílio forçado devido a seca. Se os clássicos traziam as guerras
como o motivo da partida do homem e a promessa de volta para o grande
amor, em Asa Branca, é a seca que expulsa o homem e a ave, numa metáfora
que se estende à condição humana.
"Talvez aí resida a universalidade e aceitação pelo grande público,
além de retratar a real condição das famílias nordestinas. A promessa da
volta do homem para seu grande amor está presente desde a literatura
grega, como a Odisséia. É um tema universal com que todos se
identificam", diz Armando Andrade.
A força de Asa Branca pôde ser vista em 2009, quando a Revista Rolling
Stone Brasil, publicou uma lista com as 100 maiores músicas da história
do país. Um honroso 4º lugar, ficando atrás de clássicos como Carinhoso,
Águas de Março e Construção.
Asa Branca foi primeira música tocada por Anderson do Pife (Foto: Lafaete Vaz/G1)
O tempo passou e Asa Branca segue inspirando artistas de outras
gerações. Anderson do Pife, que mora em Caruaru, no Agreste de
Pernambuco, diz que enquanto estudante de música, acredita que a letra é
parte de um método brasileiro de ensino de música popular. "Essa
melodia composta por conjuntos e de fácil execução, traduz o início de
uma trajetória musical para quase todos os que iniciam seus estudos com
ou sem ajuda de profissionais da área", diz.
Ele disse ainda que a música retrata poesia, cotidiano, paisagem e todo
o referencial histórico do Nordeste. "Eis o hino do Nordeste e a
primeira música que aprendi a tocar. Essa é a força que representa a Asa
Branca em minha vida", finaliza.